sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Café III

O café fala, o café mostra, o café conversa com a conversa da gente e nos elucida dentro de toda essa loucura que é ser. O café esclarece que não se esclarece nada; mas que tudo pode, e deve, sim, assim ser.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Coisas

Sob o olhar das páginas de um livro, a paisagem.
Uma imagem de cinema, inevitável filme o sonho meu.
A materialização de um sonho.

A torre encobre o pôr do sol.
As árvores provisoriamente castas.
O eu vigilante sob o viaduto.

Minha mão, minha mãe, meus filhos,
canções de uma vida agora sem precedentes:
momentânea mania de falar do agora.

O piano e as mesmas páginas do livro iluminadas
pela inegociável condição humana da solidão.
Um samba, um rock, uma canção de ninar.
Um conto ou romance nosso.
Uma imagem sua, no dia seguinte ao esboço de um poema,
o invade.
Tão somente sonho. Tão somente meu.
As páginas de um livro.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Nextel

Passam as bolas,
mudam placares,
eu fico.
Fincado em meu ser, à espera do tempo que passa
à deriva do tempo que vai.
Vou e volto das crises
sem me mexer.
Decido-me ao passo
e, desistindo-me, eu passo do encanto ao silêncio.
O irradiar das flores, fonemas, espaços por mim fomentados
e desiludidos.
Eu, toda a desilusão:
poética, sentida, entusiasmadíssima
caída ao chão,
repleta da dor que se faz
ao que vale
a felicidade e desgraça.
A eterna infelicidade feliz e o contrário
em se saber
escasso.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Faz-se a fé

As trilhas, os posts na rede, conversas, as marcas na pele e palavras, perguntas de como estamos. Tudo vai traçando, dia a dia, passo a passo, erro a erro, o que sou, no que vou me fazendo pelo que me dou. Cada poste, cada pedra, cada ponto ganho também. Cada acerto em seguir, já que, até onde sabemos sobre o ato da entrega, fica muito mais fácil dizer que somos certos. Cada alma que volta e conta o quanto se arrepende, e que a vida não é a covardia da morte, nos convence a ficar. Já que o único sentido é o que temos e vemos, o único caminho é o seguir. O único direito é crer.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Café II

Deu uma passadinha no bar, largou o emprego, contou à mãe, caiu a ficha e nunca mais na vida precisou tomar outro trago. Não por isso que não tenha tomado. Não por isso que tenha tomado também. Eternamente embriagado desde então.

Um plano

Nada a fazer, nada a ser,
a não ser ficar quieto.
Nada a entregar, confessar, 
ou admitir,
a não ser se deixar estar. Sentir.

Nada a sentir, a não ser tudo o que inevitavelmente está.
Talvez o sentir nunca verbo, ação do verbo sentir.
Não a ação do sentir, talvez não.

Nada a pensar, a não ser o que pensado está.
Então não haveria por onde?
Nada a perguntar, nada a crer ou não crer, 
tudo a fazer.
E há, mundo meu, de se encontrar
no fazer por algum onde estar.

domingo, 11 de agosto de 2013

Isto aqui

Foi tão pesado que nem romance deu, nem uma prosa ou canção. Tão tenebroso que até luz pôde ver. Foi tão estúpido que nem ensinar ensinou, apesar de que também. Hoje ele acordou e foi sorrir pro moço de rosto pontuado. Mas se enganou de dentes, quantidade de cortes, paladar sexual, conceitos de novos velhos hábitos. Encontrou um cara perdido a começar muito antes do zero. Viu Jesus, Mike Tyson, a vilã da novela das nove, o padre ousado, a tristeza da mãe, os olhos do mundo, os olhos do ex-amor, os olhos do cão amigo falecido em 2007, o terror, a bênção, a confiança e o pensar travado. Viu a cegueira que tanto faz agir sem, aparentemente, pensar, refletir, ponderar, pesar. Mas só aparentemente. O buraco em cada um de nós é sempre mais embaixo, ninguém se sabe.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Lendo Pessoa, lamento ao fone, questões de amores

Não é preciso, amor meu, temer o fim. Não há que temer, ao menos não mais que o próprio durante de nosso encontro. Não há que falar de medos, não há que cultivar. Tudo o que tivemos até hoje não foi um mero caso de amor, mais longe foi, pelo simples fato do não se falar de amores, mas de escolher vivê-los. Escolhamos, portanto, o que nos há de fazer viver, o que nos há de direcionar além mares da fala, falado e vivido amor meu.

Um dia Sarah

Vem sorrateira, mansamente, sorriso quieto que é todo dizeres. Quanta vida. Senta em meu colo, se aconchega em mim e me conforta no meio desse nevoeiro em que tudo se fez. Que tudo é. Sai em silêncio, mãozinhas e sorrisos despedem-se deixando-me a calma, a pena e a fé.

Todo eu

o azedo, o amargo, o dolorido
o sozinho, o triste, o bobo alegre
todos eles me são
o fugir, o lutar, o querer
o cansaço, a busca, a espera
o contrário dos jogos de brincar
de oposto
todo eu: fatos

todo eu me tenho e me perco
na mais sombria e pactual
dor de cabeça dentro do peito
todo eu dores passadas e dores a vir
dores do hoje e vontade de dores de sempre
nunca serem
enquanto, ao mesmo tempo distante
as busco

todo eu uma poesia infinita e intuitiva da vida
todo eu intuição que não sabe
arrependeres a conversar com vontade do bis
todo eu sou todo eu
inteiro

a sentir cada fala do corpo,
todo eu sou meu corpo
e meu corpo
é alma.

O Fórum de Barra Bonita

matei algo em mim
há um velório aqui dentro
uma canção de êxito, início e indefinição
uma canção de amor e morte
terror e arte.

matei algo em mim
todos se vão um dia
e o que fica é uma dor
que chega, assim como nós,
pronta pra ir, um dia.

as noites intermináveis que duram três dias
a festa daquele filme de Buñuel
a dieta, o romance, o amor sem fim
parece que também tem fim
até o meu juízo, algo tão raro
e minha ironia
se vão
um dia.

Paixões, vícios, paixões

Às vezes o já esperado pode não ser tão sem graça quanto a surpresa. Muitas vezes assim, muitas outras o contrário. Muitas vezes nos pegam do nada e pra longe nos jogam. Um tranquilo e prosaico ato de fuga nos lança ao léu, ao léu. E a cabeça, tão acostumada a sustos, pressões e horrores, trabalhar vai num escuro novo. Uma nova visão embaçada conversa com os olhos cientes, conscientes, vorazes. Libertinos conservadores com sede de mais. As paixões. O que são tão somente as paixões?

Uma pergunta

medo de escrever, falar, viver
olhar pros outros que me esperam
desferir a fúria ou a calma
não parece ser
simples questão de escolha
desferir a ação terminal
dentro de mim
alucinar sozinho
medo de dormir, medo de acordar
medo de olhar no rosto da mãe, da irmã, do patrão
medo de encontrar um total desconhecido no espelho
medo do medo a surgir
dentro do peito um canto nem fúnebre nem festa
o mais sofrido, ao menos olhando assim, agora, daqui de onde estou
é não saber de mim
muito medo de não saber de mim
por não saber de mim.

sábado, 3 de agosto de 2013

O choro

o choro do trágico, o choro da perda
o choro miséria, inveja, discórdia
o choro por não se saber quem é
e não se admitir tão qual 
quando tão claro está
o choro que faz rever fazeres, que faz fazer
o choro por não fazer
o choro do medo da indecisão sobre o que decidido está
o choro que mostra, liberta, castra
que não se permite olhar
o choro alívio e o choro que não, não se entende pra que serviu
o choro da taça erguida, da dor doída do tombo que fez se erguer
o choro graças a deus

de deus todo choro vem, o choro que é deus você
virão como sempre os mesmos, os outros e os outros novos
aquele que sempre vem
por tudo que sempre sou
o choro que é todo bem.